CRITICA DE FILME 3











 Seis mulheres para o assassino, o protagonista somos nós

Mario Bava é um diretor italiano que em comparação a seus pares, não recebeu tanta pompa e até o momento da realização desse filme, só havia trabalhado com filmes populares e de baixo orçamento, seja épicos (Peplum) ou filmes de horror gótico. O filme “Seis Mulheres para o Assassino” (1964), é considerado um dos pontapés iniciais para o Giallo no cinema, junto com o curta do telefone em “Black Sabbath” (1963) e a “Garota que Sabia Demais” (1963).
Claro que toda essa definição é um olhar em retrospectiva, uma percepção de o quão influente foi uma obra, que não necessariamente pensava em ser influente, e até por isso talvez ressalte seu valor. Ainda mais se tratando de cinema popular.

Mas o que “Seis Mulheres para o Assassino” têm de tão influente? A proposta do filme é clara, somos colocados dentro de um jogo de detetive e temos que descobrir quem é o assassino, o filme vai colocando pistas através de planos detalhes, montagem e etc. esse é o jogo de Bava, e por isso nós somos os protagonistas, ninguém ali parece muito afim de descobrir quem é o assassino, todos os personagens tem rabo preso com alguma coisa, a própria polícia em sua investigação é de uma presença secundaria. Gialli são histórias de suspense e crimes na literatura, e em boa parte das histórias quem investiga o crime é um personagem que por obra do acaso, acaba envolvido com o crime. Nós por obra do acaso estamos vendo o filme.

Além dessa dinâmica com olhar do espectador/investigador e a câmera, Bava também coloca seus personagens tal como joguetes e por isso os manequins na abertura, tal como peças no tabuleiro, que ao final quando todos já foram mortos, há uma cena do estúdio vazio, manequins desnudos, é o fim do jogo, o fim do filme, o assassino ganhou da polícia e teve suas 6 mulheres. Mas e o espectador? Conseguiu descobrir há tempo quem era o assassino?

Outro destaque, seria a cena da primeira morte, onde há uma deflagração abrupta e violenta do corpo feminino, a misoginia é uma característica dos Gialli, tal como a polícia descreve no filme, o assassino tem predileção por mulheres bonitas. Esse é um fator que afasta muitas pessoas desse estilo de cinema, e com razão, apesar de eu defender que esses filmes vão além disso. E para estruturar minha tese, irei detalhar em especifico essa primeira cena:
Nossa personagem é Isabella, que usa uma jaqueta vermelha vibrante, a câmera caminha para nos mostrar uma figura pelo reflexo da água. Detalhe para uso de sombras, para como Bava enquadra os arcos da construção do cenário, que remete muito ao estilo utilizado nos góticos italianos, tal como o anterior “A Maldição do Demônio” (1960). A câmera é viva, frenética, mas ainda assim não mostra tudo, sabe criar tensão.

A vítima segue seu caminho, num túnel com uma luz que só nos permite ver a silhueta, e tudo de repente escurece, a trilha sonora em completa sinergia com a situação criada, os sons de vento quase que provocam uma sinestesia com a cena, Sente-se o Frio! Sente-se o olhar do Assassino à espreita...

E finalmente, a câmera nos mostra a figura, sem face, entre os arbustos, mostrando que a moça está indo ao seu encontro sem saber, e então vem o ataque, sem cerimônia, cru, real e violento...

Mas em seguida a câmera continua, e mostra o corpo, do decote as pernas, a calcinha, Bava mostra para o cinema o caminho para violar o corpo feminino, e finaliza com um plano de uma escultura, possivelmente remetendo a um passado clássico, esse plano demonstra que, ele não inventou a roda, a cultura ocidental é uma cultura de violação do corpo feminino, basta remeter a narrativas clássicas, o rapto de Proserpina por exemplo, e sua representação em mármore quase Surreal de tão real.

                                           

Não escrevo sobre nada que eu não gosto ou não ache interessante, isso não é uma condenação a Mario Bava, ou ao cinema popular italiano, mas acredito que para qualquer contato com arte, devemos ter consciência, para não nos pegarmos achando que esse é apenas um filme seminal e fundador de todo uma representação da violência contra a mulher no ocidente, ele vai além disso, e por isso é relevante.


                                        Rapto de Proserpina - Bernini 




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